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Maternidade na ciência: perspectivas de equidade

  • segunda, 12 de julho de 2021

Embora a participação das mulheres na ciência nos últimos 60 anos tenha aumentado, esse crescimento foi acompanhado pelo aumento nas diferenças de gênero na produtividade e no impacto das carreiras acadêmicas em ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) 1–3. Dentre os vários fatores que poderiam influenciar nesses resultados, a maternidade é, sem dúvida, um importante tópico de discussão. O planejamento da gravidez e da maternidade representam um desafio e estresse na trajetória acadêmica da pesquisadora, principalmente em níveis de doutorado e pós-doutorado, já que além de incertezas, há a falta de direitos e políticas institucionais para dar suporte a essas famílias. Resultado disso é que, de forma geral, no Brasil, cientistas mulheres possuem filhos com uma idade mais avançada, comparando-se com a idade média nacional. Já quando se trata de docentes pesquisadores, vários estudos mostram de forma contundente, que a maternidade tem um impacto negativo na progressão de carreira, principalmente de mulheres 4–7. 

 

Diante de um cenário altamente desfavorável, muitos pesquisadores, especialmente as mulheres, diariamente se desdobram para conciliar a carreira com as atividades familiares e se veem competindo com seus pares, e exemplificando, com falta de equidade para obtenção de recursos. Com a motivação de contribuir com a mudança de tal cenário e o incômodo de ver e viver situações com ausência de paridade, surgem ações que fazem toda a diferença. Um dos grandes exemplos é o Movimento Parent in Science que, possuindo um grande alcance, tem realizado pesquisas para levantamento de dados sobre o impacto dos filhos na carreira científica de pesquisadores. Além disso, ao trazer a discussão sobre maternidade e paternidade na ciência em seminários, simpósios, redes sociais, artigos científicos e em diferentes órgãos, como no CNPq, possibilitou a inclusão de períodos de licença-maternidade no currículo Lattes, por exemplo. Não é exagero dizer que esses movimentos são responsáveis por resultados concretos, já que alguns editais de financiamento passaram a considerar o período de licença-maternidade na análise do currículo. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), nos editais para os programas Cientista do Nosso Estado (CNE) e Jovem Cientista do Nosso Estado (JCNE) - 2020, acrescentou um ano no período de avaliação da produtividade científica, no caso de nascimento ou adoção de crianças nos últimos cinco anos. O edital JCNE considerou, também, um ano a mais no tempo de contabilização. Já a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), em seu edital para o Programa Pesquisador Gaúcho 2019, admitiu um ano a mais na avaliação do CV Lattes para cada licença-maternidade ou adotante no período. Existem algumas instituições federais de ensino que, nos mais variados editais internos, contemplam as docentes pesquisadoras que se tornaram mães, assim como alguns programas de pós-graduação nas suas respectivas seleções de ingresso. A consideração varia para cada edital, mas, geralmente, aumenta o período de avaliação da produtividade ou fornece bônus de pontuação no currículo.8 

 

O Instituto Serrapilheira, primeira instituição privada de fomento à ciência no Brasil, sem fins lucrativos, em suas chamadas para submissão de propostas, considera um dos critérios para aceitação de inscrições o ano de obtenção do título de doutor do pesquisador e, estipula que a data mínima pode ser ajustada em até um ano para mulheres com um filho e, em dois anos, para mulheres com dois ou mais filhos. 

 

É importante destacar o movimento de algumas sociedades científicas brasileiras em relação às questões de gênero. Dentre elas podemos citar a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e as Sociedades Brasileiras de Física (SBF), de Química (SBQ) e de Matemática (SBM). Todas estas têm, nos últimos anos, lutado por políticas de maior equidade entre homens e mulheres.9 Nesse sentido, o levantamento realizado pelo Núcleo Mulheres SBQ, sobre a necessidade de estrutura física para receber mães pesquisadoras com seus filhos em sua reunião anual, foi de extrema relevância. Embora o evento presencial não tenha se concretizado, em função da pandemia da COVID-19, o passo foi dado e, com certeza, tornará viável a presença de muitas mães, além de servir de exemplo para outras conferências. 

 

Neste texto, tem-se um breve resumo sobre as iniciativas que circulam no país com o intuito de minimizar os efeitos da maternidade na carreira de mulheres cientistas. Infelizmente, até a presente data, órgãos de fomento nacionais não puderam ser incluídos nessa listagem. Entretanto, o movimento é crescente e bem estruturado, então, acreditamos que, muito em breve, essa seja uma realidade de cunho nacional. 

 

AUTORAS

Renata Mello Giona & Vanessa do Nascimento

 

REFERÊNCIAS
(1)     Huang, J.; Gates, A. J.; Sinatra, R.; Barabási, A. L. Historical Comparison of Gender Inequality in Scientific Careers across Countries and Disciplines. Proc. Natl. Acad. Sci. U. S. A. 2020, 117 (9), 4609–4616. https://doi.org/10.1073/pnas.1914221117.

(2)     Mavriplis, C.; Heller, R.; Beil, C.; Dam, K.; Yassinskaya, N.; Shaw, M.; Sorensen, C. Mind the Gap: Women in STEM Career Breaks. J. Technol. Manag. Innov. 2010, 5 (1), 140–151. https://doi.org/10.4067/S0718-27242010000100011.

(3)     Naidek, N.; Santos, Y. H.; Soares, P.; Hellinger, R.; Hack, T.; Orth, E. S. Mulheres Cientístas Na Química Brasileira. Quim. Nova 2020, 43 (6), 823–836.

(4)     Santos MacHado, L.; Perlin, M.; Colla Soletti, R.; Rosa E Silva, L. K.; Doerderlein Schwartz, I. V.; Seixas, A.; Klein Ricachenevsky, F.; Tamajusuku Neis, A.; Staniscuaski, F. Parent in Science: The Impact of Parenthood on the Scientific Career in Brazil. Proc. - 2019 IEEE/ACM 2nd Int. Work. Gend. Equal. Softw. Eng. GE 2019 2019, 37–40. https://doi.org/10.1109/GE.2019.00017.

(5)     Barros, S. C. da V.; Silva, L. M. C. e. Desenvolvimento Na Carreira de Bolsistas Produtividade?: Uma Análise de Gênero. Arq. Bras. Psicol. 2019, 71 (2), 68–83.

(6)     Eren, E. Never the Right Time: Maternity Planning alongside a Science Career in Academia. J. Gend. Stud. 2020, 00 (00), 1–12. https://doi.org/10.1080/09589236.2020.1858765.

(7)     Maxwell, N.; Connolly, L.; Ní Laoire, C. Informality, Emotion and Gendered Career Paths: The Hidden Toll of Maternity Leave on Female Academics and Researchers. Gender, Work Organ. 2019, 26 (2), 140–157. https://doi.org/10.1111/gwao.12306.

(8)      Movimento Parent in Science. Editais que incluem maternidade. Disponível em: https://www.parentinscience.com/documentos. Acesso em: 04 jun. 2021.

(9) Pinho, S; Menezes, D.; Santos, W.; Bolzani, V.; Malta, S. “O PAPEL DAS ASSOCIAÇÕES CIENTÍFICAS E AS QUESTÕES DE GÊNERO NAS CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA”. ANAIS DA 71ª REUNIÃO ANUAL DA SBPC: resumos da 71ª Reunião Anual da SBPC, 21-27 julho 2019, UFMS, Campo Grande / Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. – São Paulo: SBPC, 2019. Disponível em: . ISSN: 2176-1221.