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Diversidade na formação de biotecnologista/profissional de bioprocessos

  • quarta, 05 de outubro de 2022

Quem são os estudantes? Qual é sua realidade socioeconômica e grupo etnico/ racial? A sociedade como um todo será beneficiada de maneira igual na formação deste profissional?

 

De antemão, sinto informar para quem espera encontrar na biotecnologia/bioprocessos um perfil de profissional/estudante diferente do visto em áreas apontadas como tradicionais e ditas por aqueles que as compõem, como “a mais relevante de todas”. A formação de biotecnologista é apenas mais uma dentre elas, com o único diferencial da não soberba por conta de sua formação. Neste caso, a soberba se mantém por conta da posição social a qual pertence ou passou a pertencer o estudante/profissional de biotecnologia/bioprocessos.


 

UNIVERSIDADE PÚBLICA, ensino de qualidade para todos?

 

A 11ª edição do mapa do ensino superior no Brasil, nos indica que apenas 24,2% das matrículas de 2019 aconteceram em universidades públicas e que estas correspondem a apenas 11,6% das instituições de ensino superior (IES) no país. Ao longo de 39 anos (1980 - 2019), surgiram apenas 102 instituições públicas, contra 1624 da rede privada (SEMESP, 2021)

Logo, a concorrência para ingressar nas IES públicas se torna grande, devido às poucas vagas e, para selecionar o melhor aluno, o nível de dificuldade do vestibular tende a ser alto. Vale ressaltar que o ensino superior de qualidade está presente na rede pública e dependendo da área, são raras as exceções de instituições privadas com o mesmo nível. Assim, tão claro quanto o sol do meio-dia no verão brasileiro, é óbvio as poucas chances para pessoas sem acesso à educação básica de qualidade ingressarem em instituições públicas. Portanto, o corpo discente é, em sua maioria, formado por pessoas brancas, de classe média/média alta e posições acima, dependendo do curso, majoritariamente de pessoas do gênero masculino. 

Com as cotas socioeconômicas e etnico/raciais, pressupõe-se a garantia de acesso ao ensino superior público para pessoas diferentes do usual e, alinhado com o surgimento de cursinhos populares - sejam esses idealizados por membros da própria faculdade ou da comunidade a qual o aluno faça parte -, o cenário, com o tempo, tornou-se a realidade que nós encontramos, a exemplo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), cujo o curso de engenharia elétrica passou de 0 a 13,7% ou o curso de medicina da Universidade Federal de Rondônia que foi de 0 a 37,8% (HENRIQUE MORAES; ELIZABETH M. ALBUQUERQUE, 2021). Outro exemplo é a Universidade Estadual Paulista, uma das primeiras estaduais em São Paulo a integrar a questão do acesso a pessoas pertencentes ao grupo cujo as ações afirmativas abraçam e visam ter, no mínimo, 50% do corpo discente formado por pessoas de baixa renda e/ou negra  vinda de escola pública. 

Teoricamente estamos no caminho certo: grupos historicamente excluídos e com possibilidades baixíssimas de ingresso no ensino superior público, hoje têm suas chances, mas muitos esquecem que, no caso de pessoas de baixa renda, grupo este formado majoritariamente por pessoas negras e que se declaram negras, em geral não têm condições de manter mensalmente um familiar em uma universidade privada, logo financiar o estudo de uma pessoa não cabe no orçamento deste grupo. Assim, para além da garantia da vaga, é preciso  discutir e implementar melhorias quanto à permanência desse aluno, caso contrário ele continuará na retaguarda daqueles que historicamente já estão na frente.

Para tentar suprir essa demanda, em 2008 foi implantado o Pnaes (Plano Nacional de Assistência Estudantil) nas universidades federais, cujo objetivo era auxiliar o discente de baixa renda com o subsídio de alimentação, moradia, transporte, saúde, esporte, cultura, dentre outras necessidades básicas para a sua permanência. Geralmente, para ter direito a esses auxílios, o discente deve possuir renda per capita entre um e meio e dois salários mínimos, porém,  venhamos e convenhamos, famílias com renda de dois salários e meio, por exemplo, têm basicamente a mesma condição financeira das duas primeiras, ou seja, esse aluno também não conseguirá manter-se até o final do curso ou até mesmo, fazer a graduação com a qualidade que o ensino superior público oferece. 

Diante das dificuldades para a permanência na graduação do ensino superior público e ao levar em consideração a predileção do sistema de ensino a aqueles com notas melhores nas atividades propostas, fica fácil identificar qual grupo irá se destacar e com tendência a permanecer dentro do ambiente acadêmico, mas caso não esteja claro, dou uma dica: não são os estudantes de vivem sob constante incerteza financeira, alimentar, em conjunto com o estresse psicológico (desnecessário) da graduação em si, somado ao causado pelas não certezas citadas.

A lógica de manter o ensino acadêmico nas mãos de quem, historicamente, já tem o poder se mantém, mesmo aqueles de origem nas classes mais baixas, muitas vezes se deixam levar pelo ideal da meritocracia, pensamento que os leva a acreditar que os sacrifícios passados eram justos e necessários para sua formação e, consequentemente, para a ascensão social, desconsiderando qualquer relação deste com, etnia/raça, identidade de gênero e núcleo familiar. De antemão digo, não é para ser assim, o esforço sobrehumano para conseguir o básico não é saudável física e psicologicamente, o acesso à educação de qualidade, do ensino básico ao superior, é direito garantido por lei para todos (sim está na constituição de 1988). 

É compreensível a negação do acesso às camadas mais pobres, pessoas pretas/pardas e trans/travestis ao ensino superior de melhor qualidade - o conhecimento é um poder imensurável e quem o detém pode ditar a história, alcançar posições de poder, comandar sem ser questionado. Sem conhecimento não há perguntas, qualquer resposta é aceita e o melhor, sua busca, não é pelo social e sim pelo crescimento empresarial/corporativo  em união ao capital. 

Pois bem, o modus operandi da distribuição e acesso ao ensino se mantém nas chamadas profissões/áreas do futuro, como a tecnologia da informação e biotecnologia/bioprocessos. A configuração dos ingressantes nessas áreas é a mesma das mais tradicionais, principalmente quando na frente do nome do curso, vem a palavra Engenharia, expressão que denota peso e deixa implícito (ou explícito, dependo do ponto de vista) que: 

- não são todos bem-vindos, apenas os mais bem preparados e por favor, tenha ao  menos condições financeiras para se manter,

- não se preocupe com o psicológico, pois somente o básico é exigido, no máximo noites sem dormir e lidar com docentes sem qualquer tipo de didática, mas como você tem uma base forte, veio de colégios particulares, etecs ou instituições federais, são somente os melhores, por isso estão aqui.  

 

Em resumo, a quem veio de ações afirmativas, socioeconômicas ou de escolas públicas (aquelas que não é feito um vestibular para ingressar), para este, das instituições de ensino superior público está reservado o mais sincero, sinto muito, corra atrás do prejuízo, pouco importa se você vai ter o que comer ou se está preocupado com sua família, com insegurança alimentar e financeira, se você tem uma moradia de qualidade ou tem que morar em casa com mais 15 pessoas, não por sua escolha, mas porque é sua única forma de pagar uma moradia, se desenvolver depressão ou ansiedade, é uma pena, eles não podem fazer nada, pois a escolha foi sua, era para somente as pessoas com condições completas de se manter estarem lá, logo, você (nós pobres), estão aqui porque quiseram, lidem com isso e não atrapalhem. (Mas fique tranquilo em setembro você será lembrado e caso tenha tirado a própria vida por conta deste peso, tudo bem, vamos chorar por você, mas apenas em setembro, nos outros meses você será lembrado como o fraco, isso se o ocorrido for comentado com todo mundo, sim vamos tentar a abafar o caso. Bjos, faculdade pública, aqui temos qualidade e somos para poucos).

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                  

 

BIOTECNOLOGIA/BIOPROCESSOS O FUTURO, para quem?

 

Biotecnologia - estudo e aplicação de modificação genética em microrganismos e células animais. Importante para o processo de inovação lidar com questões ambientais, área da saúde, substituição de combustíveis fósseis, entre outros. Com o tempo, demonstra ser cada vez mais necessária para auxiliar na conservação e preservação da vida.

 

Bioprocessos - em geral, processos cuja presença de microrganismos é essencial ou este é o produto final, podem ocorrer desde pequena escala à escala industrial.

 

No Brasil, atualmente, a graduação em biotecnologia/ bioprocessos, em específico a de Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia, está em instituições de ensino superior público, assim são poucos os que podem acessá-la. Diante do apresentado no texto anterior fica difícil não questionar qual será o perfil do profissional desta área, porém a resposta é a mais bem óbvia. Vale lembrar que assim como a tecnologia da informação, estas duas áreas estão inseridas dentro dos chamados ‘conhecimentos do futuro’. Logo é nítido que poucos terão usufruto deste futuro.

Não há programas de auxílio permanência que realmente contemplem todo o público proposto ou com valores que realmente ajudem os alunos a permanecer no curso, não a ponto deles terem a possibilidade de usufruir o mínimo de conforto, com acesso à saúde, lazer e cultura. Ficar enclausurado em um ambiente não é saudável para o desenvolvimento e desempenho discente, mas infelizmente é este o pensamento que impera nas universidades públicas que oferecem o curso de engenharia de bioprocesso e biotecnologia, o bem estar e saúde mental, pouco importam - “traga resultados (boas notas) e valerá algo”.

Por experiência própria, posso afirmar que, não há incentivo para o profissional pensar em devolver o conhecimento adquirido para a sociedade, ao menos não de forma direta, não de maneira a precificar o produto ou serviço, de maneira que pouco importa se todas as pessoas realmente terão acesso, o importante é seja de interesse de muitos e que estes deem tudo de si para consumir/usufruir do bem criado.

Abaixo temos os relatos de dois estudantes, o primeiro está no 6º período do curso de engenharia de bioprocesso e biotecnologia, e o outro atualmente estuda engenharia de produção, mas passou 4 anos no curso de engenharia de bioprocessos e biotecnologia - ambos os estudantes são de universidades públicas do estado de São Paulo. Eles foram questionados, quanto às dificuldades de acesso à graduação; se os docentes agem de maneira a deixar claro a importância de devolver o conhecimento adquirido à sociedade em geral e o acesso universal ao produto/serviço, gerado por nós; qual o nível de diversidade do corpo discente (socioeconômico, gênero, etnia/raça); qual o discurso mais comum vindo dos docentes quanto ao futuro profissional; e o comportamento deles diante da questão de saúde mental.

 

Estudante do 6º ano de Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia:

 

Quando você me pergunta sobre a diversidade no nosso curso [engenharia de bioprocessos e biotecnologia] quase nenhuma, eu acho que a nossa turma, se eu não me engano né, foi a primeira turma com maior número de alunos vindos de escolas públicas. Foi zoação entre os professores que eu lembro muito bem e não sei se você já tava mas nos primeiros dias de aula eles achavam engraçados falar na frente da gente tipo “Ai você conhece aquela rua na França em tal lugar”, tipo mano eles tiram sarro do fato da gente ser a maior sala com com mais de 50% de escola pública e eles perguntaram eu lembro do professor perguntando só para saber assim de curiosidade perguntando quem da turma era filho de micro empresário, quem da turma tinha fazenda, quem tinha cavalo, quem tinha alguém que é da família, nossa lembro muito dessa pergunta, alguém da família que já tinha passado por uma faculdade particular ou pública e aí eu vi que eu não me encaixava nisso. Então assim a questão social e racial na nossa turma os professores tinham consciência sim, mas eles não se importavam, eles não se importavam, inclusive ouvi boatos no dia, que fato da gente ter entrado diminuía, como fala? não é status… a qualidade de ensino a qualidade do ensino como se, tipo mano, não é a gente que diminui a qualidade em cima eram eles né, mas enfim, diminuía porque a gente não conseguia acompanhar os outros alunos que vinham de escola particular e muitos reprovaram, então é culpa nossa a gente ter entrado em escola pública né, eles eram totalmente contra cotas, não só raciais mas também sociais e eles deixavam bem explícito isso, sempre deixaram, sempre desde o primeiro ano e todos os professores.

 

Os alunos você não perguntou, mas a nossa turma teve maioria mulher né, porque eu não vejo muitas outras turmas, mas a maioria mulher nossa turma uma quantidade de negros e não-brancos muito grande da nossa turma nas outras já não tem entendeu. Eu acredito que se a gente for comparar com as outras universidades que tem biotecnologia e bioprocessos também não tem muita, porque a gente participa de vários eventos online e eventos presenciais, não vi essa diversidade, né?! Tanto diversidade de gênero assim tendo mais mulheres presentes, isso é claro, mais mulheres presentes na engenharia mais diversidade racial e social eu não via.

 

Então os nossos professores ignoraram o fato porque eles fecharam os olhos para as responsabilidades deles né, então tipo, eles estavam eles fingiram estar alheio a situação e continuavam com os mesmos procedimentos né fo**-**, que vocês que se virem para acompanhar, mas era visível assim para todos que a partir dali as coisas tinham mudado queria ter uma diversidade mas ninguém ali foi preparado para lidar com aquela diversidade, é isso é muito interessante falar porque Ok, tivemos cotas raciais e sociais beleza, parabéns para quem entrou mas ninguém sabe lidar, nem que entrou muito menos quem já tava lá trabalhando ninguém sabe lidar com aquela situação, foi até uma situação muito ruim para gente. 

 

Falando sobre a questão de estar na universidade pública e todo o que eu aprendi na universidade pública se eu voltar da sociedade ou para o meu crescimento pessoal e profissional, assim né existiam professores e professores que nem eu tava pensando, eu só fui começar a discutir se realmente o que eu estava aprendendo na faculdade, tava voltado para sociedade quando eu entrei na empresa júnior e eu nem fui designada a nenhum tipo de projeto que tinha essa causa social, então por isso que eu quis entrar em uma empresa que voltado a causas sociais depois né, porque tinha essa causa social e eu queria provar essa causa social e saber como é que encaixava. Mas a maior parte do discurso que a gente ouve na universidade pública é sobre empreendedorismo, é enriquecimento, é sobre investimento. Eu lembro que no primeiro ano a gente já ouviu sobre investimento sobre sobre Startup sobre outras coisas que “gente eu não tenho ideia do que é isso”, em palestras dentro de sala de aula, professores, falando “a os investidores não veem vantagem nisso”, e eu pensava “quem são esses investidores?”, então é por isso que eu tenho tanto interesse nessas questões financeiras e principalmente nas questões de negociação entre empresa porque foi algo que tipo não tinha contado antes, eu fui ter só na faculdade quando eu cheguei lá tá mas "tá mas quem são essas pessoas? o que essas pessoas fazem?”, toda nossa formação é para você ser um empreendedor, algo que vai trazer inovações, algo que a gente escutou Na faculdade inteira foi inovações, para buscar inovações que a gente fazia algumas inovações sem sentido nos trabalhos só para ocupar espaço mesmo, só para você passar no semestre, porque eles estão constantemente incentivando a gente a buscar, inovações, buscar tecnologias, para buscar novos termos em inglês que estavam em alta, porque a questão financeira sempre foi alinhada muito sucesso entendeu?!

Então se daqui uns anos eu tiver retornado, tiver trabalhando com algo que retorne o meu conhecimento para a sociedade mas não tiver condição financeira aceitável, eu acredito que os professores não vão me ver como um aluno que teve sucesso, mas se eu tiver uma empresa, se eu tiver uma posição (social) alta, ou tiver um retorno financeiro muito grande que não tenha qualquer retorno social para sociedade, eles falam “não essa aluna teve sucesso e aprendeu o que a gente tem que ensinou”. Então a linha de pensamento completamente diferente do que a gente tava esperando, do que eu estava esperando na faculdade, entendeu?! 

 

(...)Vários tipos de extensões para você já ir se habituando com esse empreendedorismo com os coaches da vida, com os discursos do tipo “trabalhe e estude enquanto eles dormem” “se você não se esforçar ao máximo, você nunca vai ter nada”. Inclusive dentro da faculdade mesmo eles, normalizam o desgaste, a desvalorização da vida, da sua individualidade, então é muito difícil a gente conversar sobre a universidade pública em pensar de alguma forma você vai sair dela pensando na sociedade, não você vai sair dela desesperado falando “meu Deus eu fui triturado nessa universidade e eu preciso construir uma vida minimamente confortável para mim”, entendeu?! 

 

Então, tipo não existe visão de retorno social, não existe isso, acho que não existe nem tempo de universidade pública pra isso, a ironia de tudo que eu pensei que em um curso integral, eu ia parar de engolir conteúdo e ia aprender de verdade, foi completamente ao contrário eu só pensei “vou vai ter mais tempo para estudar”, tive mais tempo para estudar? Não, eu só engoli conteúdo, 5 anos engolindo conteúdo, passando em provas retículas, entregando muita coisa que eu não concordava, aí eu não podia nem questionar mas entregado.

 

E aí eu vou sair da faculdade, vou para um trabalho que eu vou entregar, que eu vou consumir conteúdo e entregar, eu vou continuar a mesma coisa tentando salvar o que sobrou da minha saúde mental e inclusive algo que também não é discutido na universidade, chega ali setembro Amarelo prevenção de suicídio e eles falam “vocês são importantes não são números”, né?! “cuidem da sua saúde mental”, mas quando você realmente precisa cuidar da sua saúde mental, sempre tem uma resposta negativa.

 

Estudante de engenharia de produção, que estudou 4 anos no curso de engenharia de bioprocessos e biotecnologia:

 

Vou falar um pouco da minha experiência... Questão de diversidade e inclusão eu acho, acho não tenho certeza, pelas minhas experiências no tempo que eu passei aí, eu eu me sinto um pouco de falta assim, eu acho que a gente tem as políticas inclusivas na universidade que já fazia um tempo elas ajudam um pouco, mas ainda sem eu sinto um pouco demais programa de acessibilidade estudantes de que vem de colégios públicos. No meu caso por ser negro, vou dar minha experiência, outros casos de relacionada a sexualidade e gênero, não vou saber discutir porque é uma coisa muito mais a fundo, e é uma coisa que eu não sinto tanto. Eu sinto que pelo menos agora, eu não sei como é que tá a universidade, mas na minha época, tipo, eu também não me sentia tão incluído, eu sentia que vinha de um mundo um pouco diferente, assim só tratando sobre mim.                                                 

Assim, tipo, vou falar do meu caso, mas também é o caso geral, tudo depende um pouco, quando eu tive um período que tava com a saúde mental comprometida… alguns professores me apoiaram mas foram bem poucos, comparados com a maioria. Eles não têm essa preocupação, mesmo a faculdade, ela não tem um núcleo com esses cuidados, a gente tem uma faculdade medicina, mas o ideal é que tivesse um cuidado melhor com os alunos,  ter uma estrutura melhor e eu vejo que falta muito isso sabe, mas não só com relação a preocupação da minha experiência, mas num geral sabe?! Atividades de várias coisas, enfim, várias                                                                                                                                                                                                                                                                                                  coisas que acontecem dentro da Universidade. Sabe?!

 

O nome dos estudantes não foram revelados, pois ambos assim pediram e o primeiro ainda tem vínculo com a faculdade. Ambos são negros, de baixa renda e acessaram a universidade pelas cotas raciais. O primeiro fez cursinho pré-vestibular, tanto pago quanto popular, antes de entrar na faculdade, já o segundo era aluno da ETEC.

 

Algo que não foi questionado a eles mas, por estar no mesmo curso, posso afirmar, não há professores negros que fazem parte do corpo docente do curso, não há uma disciplina que discuta de maneira séria a relação entre o curso e a sociedade e que traga aos alunos o questionamento sobre o mundo, pelo contrário, a disciplina que poderia falar sobre, apenas reforça os pensamentos ja estabelecidos “se esforce ao máximo, se fulano conseguiu, você tambem consegue”. Pouco importa o fato de vocês serem pessoas diferentes, indivíduos com realidades e capacidades diferentes. E caso você queira ser um pesquisador e não tem notas boas, não seja, “foque nas suas notas, no momento não vou aceitar fazer iniciação científica com você". O pesquisador segue sendo o ser mediano que teve acesso à educação básica de qualidade ou excepcionalmente pobre, que conseguiu sobressair a sua dificuldade. A você, mediano, pobre e que vive as incertezas sociais (principalmente, financeira e alimentar), resta fazer um curso técnico ou procure um ensino superior de qualidade duvidosa, se forme e seja mais um no fim da fila. Pesquisa? Laboratório? Ciência? Biotecnologia? Bioprocesso? é para poucos e você não pode sentar com a gente. 

 

Escrito por: WILLIAM DE ALMEIDA CORREA MACHADO

 

Referências

 

ABREU, Márcia Kelma de Alencar; XIMENES, Verônica Morais. PERMANÊNCIA DE ESTUDANTES POBRES NAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA. Revista Psicologia da Educação, [s. l.], v. 1, n. 50, 2020. Disponível em: http://www.gnresearch.org/doi/10.5935/2175-3520.20200003. Acesso em: 17 ago. 2022.

 

HENRIQUE MORAES, Gustavo; ELIZABETH M. ALBUQUERQUE, Ana. Vista do v. 3 n. 4 (2021): Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais: Cenários do Direito à Educação. CADERNOS DE ESTUDOS E PESQUISAS EM POLÍTICAS EDUCACIONAIS, [s. l.], v. v. 3, n. n. 4, p. 338, 2021. Disponível em: http://cadernosdeestudos.inep.gov.br/ojs3/index.php/cadernos/issue/view/491/127. Acesso em: 17 ago. 2022.

 

SEMESP, Instituto. 11a  edição do Mapa do Ensino Superior no Brasil. INSTITUTO SEMESP, , 2021. Disponível em: https://www.semesp.org.br/wp-content/uploads/2021/06/Mapa-do-Ensino-Superior-Completo.pdf. Acesso em: 17 ago. 2022.